A Rede Globo (J.B. Oliveira, o Boninho, na foto) revelou, em agosto de 2020, que irá produzir uma nova versão do famoso reality show The Voice, que terá como grande diferencial a necessidade de que todos os participantes inscritos tenham mais de 60 anos. As inscrições já estão abertas.

Mas existem motivos que poderiam justificar essa nova edição da franquia?

Essa nova versão do The Voice surgiu em 2018 nos Países Baixos, terra natal do reality, e foi criada por John de Mol, responsável pelo The Voice, para competidores entre 18 e 55 anos, e The Voice Kids, para cantores com menos de 18 anos.

O formato da edição para idosos, nomeada The Voice Senior, segue o mesmo das outras versões: os jurados, três no Kids e quatro no adulto e Senior, ficam virados de costas para os cantores e, se gostarem das apresentações, viram a cadeira para tentar incluir o candidato em seu time. Depois dessa primeira fase ocorrem as fases de duelos, as apresentações ao vivo com votação do público e a final, que consagra o campeão.

Mesmo sendo recente, o conceito do The Voice Senior se espalhou pela Europa, ganhando versões na Alemanha, Rússia, Espanha, Bélgica e outros países. Fora do continente, a Tailândia, a Arábia Saudita e o México também lançaram suas versões do reality, uma lista que contará com o Brasil a partir de 2021.

O envelhecimento da voz

Mas pensando em questões técnicas, também faz sentido ter uma edição exclusiva para os idosos competirem. O passar dos anos leva a uma série de mudanças no corpo, o que não é diferente com a voz. As alterações vocais causadas pelo envelhecimento são chamadas cientificamente de presbifonia.

Evelyn Alves Spazzapan, fonoaudióloga que pesquisou a presbifonia em seu mestrado na Unesp, explica que as mudanças são hormonais e também ocorrem na camada que reveste as pregas, ou cordas, vocais. Os sons são emitidos pela vibração dessas pregas conforme o ar passa por elas, e portanto variações nelas influenciam nos sons gerados.

“Há um arqueamento da prega vocal que forma uma fenda, que permite passagem maior de ar, o que modifica a qualidade vocal”, explica Evelyn. Pesquisas mostram que isso leva à alteração da voz em mulheres, que no geral fica mais grave, mas ainda não há consenso sobre o efeito em homens. No geral, porém, observa-se que a voz fica mais rouca, e é eliminado mais ar enquanto o som é emitido.

Esse processo de envelhecimento ocorre durante toda a idade adulta, mas se intensifica conforme a pessoa chega na chamada terceira idade, geralmente a partir dos 60 anos. “Essas mudanças não ocorrem da mesma forma para todos e nem todos os órgãos e funções do nosso corpo envelhecem da mesma forma e no mesmo tempo”, observa a fonoaudióloga Deborah Gampel, que estudou os efeitos dessas alterações em seu mestrado.

A intensidade da alteração na voz de um idoso depende, assim, de diversos fatores, passando tanto pela genética quanto pelos hábitos que essa pessoa teve ao longo da vida. Ingestão de álcool, fumo, falta de hidratação, presença de refluxo gastroesofágico e também um abuso da voz afetam a qualidade da mesma, e aceleram o processo de envelhecimento.

Por outro lado, fazer o oposto dessas práticas ajuda a preservar a voz por mais tempo.  Pessoas que abusaram muito da voz, ou hábito de ingestão de álcool e fumo prejudicam a voz. No caso do canto, é importante que a pessoa enxergue a voz como um instrumento, e tome os devidos cuidados para preservá-la, em especial as práticas de aquecimento e desaquecimento vocal após apresentações.

Além da preservação vocal, Gampel considera que é importante que as pessoas saibam se adaptar às inevitáveis mudanças que atingirão a voz, e o canto, com o tempo.

Evelyn considera que o envelhecimento da voz torna mais difícil para cantores atingirem notas mais agudas, e demanda um aparelho respiratório mais potente. Nesse sentido, ela aponta que faz sentido separar idosos e adultos para realizar uma avaliação técnica, por mais que as mudanças na voz variem a cada pessoa. “É muito difícil comparar uma voz de um idoso, colocar em um mesmo grupo de um adulto de 20 anos. A qualidade vocal é diferente, a extensão é diferente”, opina.

Vídeo mostra Jimi Bellmartin foi o campeão da primeira edição do ‘The Voice Senior’, de 2018, quando tinha 69 anos de idade. Países Baixos (Holanda)

Compacto do Estadão Digital

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