Aprendendo a Envelhecer _ os medos reais do envelhecimento

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Trecho de uma entrevista do epidemiologista e gerontólogo Alexandre Kalache ao jornal La Nación

A velhice, como ele mesmo diz, gera medos: “Ao longo dos séculos, sempre houve o horror de envelhecer sem saber se vai ter um teto sobre a cabeça, se vai ter o tratamento [médico] de que precisa , ou se for abandonado por negligência. ”.

Diante disso, Kalache aposta que os governos adotem políticas de proteção aos idosos. Algo que já havia afirmado em 2002, quando foi um dos promotores do documento “Envelhecimento ativo: um quadro político”, apresentado pela OMS.

– Quais são os desafios que os países da região enfrentam para criar políticas que acompanhem a revolução da longevidade?

-Existem quatro eixos. A primeira é a saúde. Envelhecer sem saúde levará a uma má qualidade de vida. E isso vai depender do esforço pessoal, mas também de políticas adequadas para que você possa ter acesso a alimentos mais saudáveis ​​e acessíveis, ou fazer atividade física em um ambiente seguro. Agora, e se você mora em uma favela e quer passear se houver balas perdidas ou as calçadas estiverem esburacadas? O segundo eixo é o conhecimento. Precisamos de políticas de aprendizagem ao longo da vida, desde a infância até à velhice. Assim, as pessoas mais velhas podem ser produtivas. A terceira está relacionada à participação desse grupo. E a última é a proteção, a garantia de que o idoso não será abandonado, que continuará sendo incluído e que receberá cuidados quando precisar.

https://www.lanacion.com.ar/sociedad/la-revolucion-de-la-longevidad-envejecer-es-la-gran-conquista-social-de-los-ultimos-100-anos-dice-un-nid18092022/

Outro trecho sobre os medos reais, entrevista do Dr. Alexandre Kalache ao Estadão. O tema era pandemia, mas aqui ele trata de problemas de 4 milhões de idosos que sofrem com a solidão do cotidiano

Para Alexandre Kalache, presidente do Centro Internacional de Longevidade no Brasil, que dirigiu por 14 anos o Programa Global de Envelhecimento e Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS), não estamos diante de um problema exatamente novo: a solidão, diz ele, já era enfrentada por 4 milhões de brasileiros antes da pandemia.

Em entrevista ao Estadão, Kalache comenta sobre a resiliência que os idosos costumam ter durante crises como a que estamos vivendo e destaca a importância da sociabilidade para o envelhecimento saudável. “Mais importante ainda é ter um propósito, para não sentir que a vida está vazia”, afirma. Um dos lugares em que idosos podem encontrar essa motivação é no trabalho voluntário, sugere.

A seguir, confira os principais trechos da entrevista.

• Quais são os principais impactos que a pandemia pode causar nos idosos?

A covid-19 não forjou nossas mazelas, ela apenas está deixando-as escancaradas. A pandemia traz à tona questões muito antigas. O isolamento de idosos não é uma questão apenas deste momento: cerca de 4 milhões de idosos vivem sozinhos no Brasil, e são pessoas que mesmo antes da pandemia estavam habituadas a viverem só. Muitos idosos enfrentam essa solidão com muita dificuldade, porque não foi por opção – são pessoas que, por exemplo, não tiveram filhos ou os filhos vivem longe. Há também a questão do abuso e dos maus-tratos ao idosos, cujos registros têm aumentado no disque-denúncia. Mas, como sempre, em um país com tantas desigualdades, os efeitos da pandemia são bastante variáveis, dependendo da caixinha em que você está. Há pessoas idosas que têm recursos tecnológicos e sabem usar as ferramentas, o que faz com que elas estejam isoladas sem estarem sozinhas. Ao mesmo tempo, existem idosos que estão preocupados se vão ter o que comer hoje.

• Como os idosos costumam lidar com situações adversas?

Em geral, eles costumam ter bastante resiliência. Como o idoso já passou por muitas e boas, ele consegue ver que há uma luz no final do túnel, enquanto uma pessoa jovem facilmente se desespera, entra em ansiedade e fica com medo da situação. O idosos olha para trás e lembra que já viveu outras adversidades que passaram. A resiliência é você dispor de reservas internas para vencer as dificuldades, os traumas e até as perdas que uma vida mais longa pressupõe. Entretanto, apesar de idosos serem mais resilientes, eles estão sentindo hoje a perda dos dias sem poder ver os netos, os amigos e sem poder passear. E eles sabem que essa é uma grande proporção da vida que lhes resta.

• Qual é a importância da sociabilidade nesta fase?

Existem alguns fatores que, se acumulados, podem ajudar você a envelhecer com qualidade de vida e a se tornar um idoso vivo e ativo. Primeiro, há os capitais de saúde: acho que todo mundo concorda que se a saúde vai embora, a qualidade de vida também vai. Há também os capitais de conhecimento, porque é importante aprender constantemente para não se tornar obsoleto. Um outro fator é justamente o capital social, mantendo amigos e relacionamentos. A sociabilidade é inclusive um fator de proteção, como ter alguém que cuide de você caso surja alguma doença. Por fim, há o capital financeiro, que não resolve tudo, mas ajuda no envelhecimento. Contudo, esses capitais sozinhos não são suficientes: eles não adiantam se você não tiver um propósito de vida, se não souber por que acordou e se vai levando a vida sentindo que ela está vazia.

• É comum que idosos percam esse propósito na velhice?

Isso acontece sobretudo com os homens idosos, que ao longo da vida se acostumaram a depositar todas as fichas na profissão. Quando eles se aposentam de repente, ficam perdidos. O trabalho voluntário é uma boa opção para encontrar propósito. Encontre uma causa e faça o bem para alguém. Em um país com tanto problema social, tem muita gente precisando da sua ajuda.

Estabelecer metas e desafios é algo importante durante a vida toda. A vida é um curso: você não se transforma de repente aos 70 anos. Quanto mais cedo você começar a se preparar para a tal da velhice, tendo metas e objetivos, melhor. Se você não começou aos 20, comece aos 30, ou então aos 50. Você vai precisar de metas, disciplina e determinação para lidar com esse tempo maior que surge com a velhice. A vida antigamente era uma corrida de 100 metros, mas hoje é uma maratona. É importante a cada dia atingir uma meta e fazer um pouco mais para si a fim de chegar bem no final maratona.

Estadão Digital

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