Demência, uma epidemia silenciosa

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A Demência é um declínio cognitivo crônico e progressivo. A medicina conhece vários tipos: as demências vasculares; por Parkinson; senil; fronto-temporal; de Pick; com corpos de Lewy e o Alzheimer (a mais comentada).

A incidência é assustadora. Em pessoas acima de 80 anos, a Demência se aproxima a 30%.

A principal causa das demências é o envelhecimento. O século XX triplicou a vida média. Em pouco tempo, os idosos deixaram de ser uma reduzida minoria. A pirâmide etária foi invertida.

Com exceção do período antediluviano bíblico, onde se vivia muito, Matusalém viveu 969 anos em pleno comando de suas faculdades mentais, a humanidade nunca enfrentou o problema da velhice. A vida média no Brasil era de 29 anos, no início do século XX. Se envelhecia muito cedo, aos 40 anos.

O século XIX tentou várias formas de rejuvenescimento, como o implante de testículo e enxerto glandulares. O extrato de testículos bovinos era bem vendido nas lojas de produtos naturais.

Na medicina antiga, a melancolia era um prenúncio da Demência. 

Cuidar dos caducos que perdiam o tino, era responsabilidade das famílias. A Demência era o destino de quem endurecia as artérias, os esclerosados, assim como as vítimas de AVC (o miolo mole, o amolecimento cerebral). Não se conhecia a capacidade de regeneração do cérebro.

A maioria das Demências decorriam da arteriosclerose cerebral, que poderia ser causada pelo álcool, fumo, pressão alta, sífilis e envelhecimento (a causa principal). Era a crença médica.

A melhoria da qualidade de vida e a medicina prolongaram a vida, sem ter encontrado uma solução para as doenças crônicas degenerativas, típicas da velhice. No máximo, tornaram os idosos em clientes da indústria farmacêutica.

A Demência é uma doença do espírito, com a abolição da capacidade racional, com o enfraquecimento do entendimento e da memória.

As mudanças sociais tornaram a Demência mais visível. A redução do suporte familiar, arrebanhou os idosos em asilos e enfermarias geriátricas. Os problemas dos idosos saíram do secreto “seio familiar” para as instituições médicas.

A Salpêtrière foi a primeira instituição científica geriátrica. Os hospitais parisienses, Salpêtrière e Bicêtre, acumulavam no final do século XIX, mais de 4 mil velhos apinhados como sardinhas.

Charcot (1825 – 1893) incluía entre as doenças típicas da velhice: o marasmo senil; a atrofia do cérebro e a calcificação dos vasos sanguíneos.

Morel (1809 – 1873), psiquiatra francês, acreditava que a Demência era uma doença degenerativa do cérebro, hereditária e progressiva.

O estado depressivo nos idosos, a melancolia senil, era tido como uma prova dessa degeneração orgânica. A Demência era vista como uma fatalidade. O pessimismo sobre o envelhecimento alcançou o cume.

Emil Kraepelin (1856 – 1926), o papa da psiquiatria orgânica, discordava das teses degeneracionistas das doenças mentais e da conexão direta entre envelhecimento, melancolia e Demência. A descoberta de Alois Alzeheimer (1864 – 1915) desafiou a ideia da degenerescência natural da senilidade, reforçando o pensamento de Kraepelin.

A geriatria é filha da neuropsiquiatria. Surgiu no mesmo ninho. Os velhos foram submetidos ao olhar exclusivo dos médicos, ao longo do século XX.

A psiquiatria cuidava da Demência aguda (estupor), da Demência precoce (esquizofrenia) e das Demências vesânicas. E mais nada! Hoje, a velhice está medicalizada. A medicina vende a ilusão de enfrentar os problemas da condição humana. E mais nada! 

A ciência resolve alguns problemas e cria outros. Diagnosticar a Demência por testes de memória, corre o risco de se patologizar o esquecimento natural e até necessário da vida, o esquecimento benigno.

Ocorre que, os serviços públicos de saúde e a sociedade têm encarado a Demência como uma fatalidade esquecida.

A Demência não é um estágio obrigatório da vida, mas uma doença definida. Se não existe cura, existe a prevenção; se não podemos evitá-la, podemos retardá-la. É o discurso médico!

O Alzheimer tornou-se um grave problema de Saúde Pública no século XXI? Ou o que está em jogo são os interesses econômicos envolvidos na definição de uma “cultura alzeheimer” e na medicalização da velhice?

As alternativas não são excludentes!

A novidade histórica do envelhecimento em massa das populações suscita novos problemas. Recrudesce e acentua os antigos. O drama da velhice é repleto de surpresas.

Caducos do Mundo, Uni-vos! “

Compacto do artigo do médico sanitarista Antonio Samarone para o site 93notícias.com.br

https://93noticias.com.br/noticia/58946/Demência-uma-epidemia-silenciosa-por-antonio-samarone

 

 

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