Reginaldo Manente, 88 anos, o fotógrafo do armário de Pelé

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Inicialmente, o Santos informou que não ia abrir o armário que Pelé deixou trancado na Vila Belmiro. Em 1974, o Estadão fez imagens exclusivas sobre os guardados do Rei no vestiário. O fotógrafo Reginaldo Manente, hoje com 88 anos e 64 de profissão, foi quem mais acumulou prêmios Esso, a maior distinção aos profissionais de imprensa no Brasil até 2014. Meu Idoso Favorito, 88 anos.

Com a morte de Pelé, a pergunta sobre o que teria ficado dentro do armário do jogador do Santos no vestiário da Vila Belmiro despertou a curiosidade geral. Segundo a lenda, Pelé teria deixado um objeto guardado lá quando se despediu do Santos, no jogo contra a Ponte Preta em 2 de outubro de 1974, e trancado com chave a porta do armário, que desde então nunca mais teria sido aberto.

Embora não seja possível afirmar o que foi deixado pelo rei do futebol no armário, fotos inéditas arquivadas no Acervo Estadão mostram alguns dos objetos que estavam no armário naquela noite de despedida.

NEGATIVOS DIGITALIZADOS. Digitalizadas em altíssima resolução a partir dos negativos fotográficos originais, as imagens de autoria do fotógrafo Reginaldo Manente, do Estadão e do Jornal da Tarde, revelam detalhes como uma pequena estátua de Nossa Senhora, um troféu, um ramalhete de flores, um estojo daqueles que embalam placas de homenagem e um recipiente, aparentemente de talco Soapex. Também é possível ver pares de chuteiras, dois cabides vazios e, num dos fotogramas, as solas de um par de sapatos.

MENSAGENS. Nas fotos também é possível ver duas mensagens escritas a giz para Pelé na face interna da porta de madeira do armário. A primeira, assinada por Marinho, diz: “Eu gostaria de estar aqui na despedida do maior jogador do mundo”. Da segunda, com Pelé encobrindo parte dela, é possível ler trechos não contínuos: “Pelé não tive oportunidade de me despedir… honra e um prazer… do amigo…”

REGINALDO MANENTE. Autor das fotos exclusivas de Pelé chorando no vestiário após deixar o campo, o fotógrafo Reginaldo Manente disse não se lembrar do que tinha dentro do armário. “Eu estava focado no Pelé e não direcionei minha câmara para o armário”, contou por telefone, direto de Tupã, onde mora no interior de São Paulo.

As imagens endossam a fala de Manente. Nos fotogramas onde é possível ver os objetos no armário, o foco está sempre na cabeça de Pelé ou de alguém que se aproxima dele no momento da captura da imagem.

Um dos mais premiados profissionais do fotojornalismo brasileiro, Manente é autor, entre outros trabalhos memoráveis, da foto de um menino chorando na Copa do Mundo de 1982.

No dia da despedida de Pelé, Manente conta que teve de usar da astúcia para fazer as imagens exclusivas do Rei chorando sozinho no vestiário. Com a Vila Belmiro lotada de fotógrafos e repórteres em campo, Manente decidiu se afastar dos colegas e foi para o túnel que leva aos vestiários logo no começo do jogo.

LÁGRIMAS DE PELÉ. Na escada de acesso, encontrou com um segurança que o barrou. Manente então disse que o filme de sua máquina havia travado e precisava de um lugar escuro para retirá-lo, sob risco de perder todo o trabalho que já havia feito.

O segurança argumentou que não havia lugar escuro no vestiário, mas Manente disse que daria uma jeito, se fosse o caso tirando a própria roupa para garantir um pequeno canto de escuridão lá dentro, mas que ali no campo não seria possível. O guarda então o liberou e esqueceu do fotógrafo, que ficou sozinho um tempão no vestiário aguardando a chegada de Pelé.

“O Alberto Helena Júnior, pauteiro, queria que eu fizesse uma foto do Pelé tirando as chuteiras. Mas o Pelé chegou e já foi tirando a chuteira com o calcanhar, sem sentar e já foi abrindo o armário. Ele me viu, mas não disse nada. Eu também não falei com ele. Só fiz as fotos”.

Pelé nem se trocou. “Não vou conseguir falar nada”, disse, emudecendo a todos ao redor. “Vocês podem não acreditar, mas tive a despedida que queria. Fiz tudo para não chorar, mas não consegui”. Saiu do vestiário pela porta que dá na rua Tiradentes de calção, sem camisa, escoltado por policiais e entrou numa viatura.

O Estado de São Paulo (compacto)

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